Desde a quarta-feira (1º de junho), os adolescentes apreendidos praticando atos em conflito com a lei, no município do Rio, estão sendo encaminhados diretamente para o Núcleo de Audiência de Apresentação (Naap) da Vara de Infância e Juventude da Capital, onde são recebidos por uma equipe multidisciplinar, conversam com defensores públicos e são ouvidos por um promotor e pelo juiz.  Apenas os meninos e meninas autores de delitos mais graves são enviados ao Degase, para cumprimento de medida socioeducativa. 

Os adolescentes cuja apreensão tenha sido motivada por infrações leves são entregues à família ou, na ausência desta, acolhidos pelo sistema protetivo. Cerca de 15 adolescentes entre 12 e 18 anos incompletos são enviados diariamente às unidades de internação, já superlotadas.  Dados do Tribunal de Justiça dão conta de que cerca de metade das apreensões são relativas a atos análogos a furto, tráfico de drogas e infrações menos graves.

- Esse é um avanço muito importante do sistema de justiça do Rio, pois tornará o atendimento mais ágil e contribuirá para reduzir a superlotação das unidades do Degase. Temos uma cultura muito forte de internação provisória por furtos ou danos patrimoniais – explicou a coordenadora de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente (Cdedica) da Defensoria Pública do Rio, Eufrasia Maria Souza das Virgens.

A abertura do Naap ocorreu exatamente no dia de apreciação, pelo Congresso Nacional, da PEC (Proposta de Emenda à Constituição) para garantir ao Ministério Público poder para solicitar exceções, caso a caso, à inimputabilidade penal antes dos 18 anos. Segundo a defensora pública Eufrasia, as audiências de apresentação são a alternativa para demonstrar, inclusive, que o adolescente em grave conflito com a lei já está passível de punição legal.

- É preciso dar relevância aos casos que requerem medida de privação de liberdade já prevista na lei e não conferir a mesma importância a todos os episódios. Existe a percepção equivocada de que o adolescente não responde por atos graves – analisa.

O defensor público-geral, André Luis Machado de Castro, um dos signatários do termo de cooperação técnica formalizado na terça-feira (31), em solenidade no Tribunal de Justiça, para a criação do Naap, destacou que a inovação é “um grande passo civilizatório”.

- Essa iniciativa visa a garantia dos direitos humanos, da Constituição da República e do Estatuto da Criança e do Adolescente, as quais preveem prioridade absoluta ao adolescente. É também um grande passo na gestão do sistema de justiça e de garantias, integrando todos os atores – disse.

O Naap torna mais ágil o fluxo de atendimento ao adolescente apreendido em conflito com a lei. Ao invés de passar pela delegacia da área da apreensão, ser enviado à Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente e de lá ao Degase, de onde só sairia alguns dias depois para o primeiro contato com o sistema de justiça, o menino ou a menina sai da delegacia direto para o Forum. Se a apreensão ocorrer à noite, ele ficará em local especialmente criado para o acolhimento temporário, de algumas horas, à espera de atendimento no núcleo.  

- Prevalece o princípio de prioridade absoluta e atendimento integral aos adolescentes previstos na Constituição -  acrescentou a juíza  titular da Vara da Infância e da Juventude de Competência Infracional Vanessa Cavalieri Felix, que coordenará o Naap.  Ela enfatizou que as audiências de custódia,  em funcionamento no Estado do Rio de Janeiro desde o segundo semestre do ano passado, já vinham assegurando aos adultos exatamente o que as audiências de apresentação garantirão aos infratores que ainda não completaram 18 anos de idade.

Também presente à cerimônia de criação do núcleo, o diretor do Degase Alexandre Azevedo de Jesus  lembrou que, no ano passado, houve, no Estado do Rio de Janeiro, 10.300 adolescentes internados no sistema, quase quatro vezes mais que os 2.800 internados em 2009.

-Essa nova rotina de atendimento reduz uma situação que degrada o adolescente, nos degrada e degrada toda a sociedade que, às vezes, sente certo alívio quando há apreensão,  com uma segurança ilusória. Tratamos aqui de direitos humanos, de Constituição e de Estatuto da Criança e do Adolescente, instrumentos indispensáveis para atender parcela desses adolescentes que nunca tiveram chance – concluiu o presidente do Tribunal de Justiça, Luiz Fernando Carvalho.    

O termo de cooperação técnica foi assinado pelo TJ, pela Defensoria Pública, pela secretaria estadual de Educação, à qual é vinculado o Degase, pela secretaria de Segurança Pública e pela secretaria municipal de Desenvolvimento Social. Esta última participa da iniciativa cedendo equipes multidisciplinares que atenderão os meninos e meninas apreendidos já na chegada ao Naap, para localizar a família.  A Polícia Civil oferece o espaço especialmente destinado à permanência dos adolescentes quando o horário não permitir que sejam levados de imediato ao núcleo. 

 



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