A Defensoria Pública do Rio de Janeiro foi habilitada como amicus curiae – amigo da Corte ou parte interessada – na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIn) que suspendeu parcialmente o decreto de indulto natalino. A decisão foi anunciada nesta quinta-feira (1º) pelo ministro Roberto Barroso. A decisão considerou a representatividade da Defensoria, bem como a pertinência e abrangência do tema. Pela mesma razão, foi solicitada urgência no julgamento da matéria.
 
A ADIn foi movida em dezembro pela Procuradoria Geral da República (PGR) sob o argumento de que beneficiaria condenados por corrupção, mas, no entendimento da Defensoria, atingiu toda a massa carcerária, impedindo, na prática, que presos comuns tenham acesso ao benefício.
 
Para a Defensoria, não há nada de inconstitucional no Decreto 9247/17, editado em dezembro pelo presidente da República. Ao contrário, as medidas restritivas é que afrontam a Constituição, com ao menos três consequências imediatas: o incremento exponencial da retenção carcerária; a impossibilidade de abertura de novas vagas no superlotado sistema prisional e a impossibilidade de concessão não somente do indulto, mas também da comutação de pena, ainda que este instituto não tenha sido objeto da impugnação do Ministério Público.
 
– A grande preocupação da Defensoria Pública é com o impacto que a decisão vai provocar no sistema penitenciário, já que impede a liberdade de milhares de presos, agravando ainda mais o dramático cenário de superlotação das prisões brasileiras. Ao mirar no criminoso do colarinho branco, a decisão acertou em cheio a parcela mais vulnerável da massa carcerária, formada por jovens, negros e pobres que, de acordo com decretos dos últimos 20 anos, teriam direito ao indulto –, afirma o defensor público Leonardo Rosa, subcoordenador do Núcleo do Sistema Penitenciário e um dos autores da petição.
 
Entenda
 
No texto, a Defensoria elenca diversas incoerências provocadas pela decisão, como a que suspende a concessão do benefício para os presos do regime aberto (Art. 8º, inciso II do decreto presidencial). Na prática, detentos do regime fechado e semiaberto continuam habilitados a receberem a liberdade, ao passo que aqueles que cumprem pena em regime menos severo estão excluídos dessa possibilidade.
 
Outra incongruência é a exclusão dos presos provisórios que já tenham condenação em primeira instância (Art. 11, inciso I), enquanto detentos definitivamente condenados continuam aptos ao indulto. “A suspensão dessa norma fere o princípio da proporcionalidade porque permite o indulto para presos com processos transitados em julgado, sobre os quais não cabe mais qualquer recurso, e o veda àqueles que ainda podem recorrer e ser absolvidos ou ter a pena reduzida”, observa Rosa.
Os defensores questionam, ainda, o condicionamento do benefício ao pagamento da pena de multa. A pretexto de impedir o perdão de condenados por corrupção, a exigência da quitação atingiu diretamente a parcela de presos que não tem como arcar com esse ônus. Decretos anteriores nunca vincularam a soltura do condenado ao pagamento deste valor, ainda que não isentassem o indultado de seu pagamento no futuro.
 
No pedido de habilitação como amicus curiae, a Defensoria lembrou que normas indulgentes idênticas ou similares jamais foram questionadas, tornando evidente que a polêmica provocada pelo último decreto está diretamente ligada ao contexto episódico e juridicamente particular que visa afetar um grupo específico de pessoas privadas da liberdade. O problema é que, face à turbulência atual instalada na sociedade, produz efeitos que ultrapassam os limites inicialmente pretendidos. “Assim, de uma forma ou de outra, todas as pessoas privadas de liberdade – e não só aquelas criminalmente envolvidas na “Operação Lava Jato” – acabaram por serem englobadas pela decisão suspensiva.”
 
Além de Leonardo Rosa, assinam a petição o defensor público-geral do Rio de Janeiro, André Castro, e os defensores públicos Emanuel Queiroz e Ricardo André de Souza, da Coordenação de Defesa Criminal da Defensoria, Marlon Barcellos e João Gustavo Fernandes, ambos do Nuspen.
 
Confira a íntegra da petição deferida pelo STF no link goo.gl/Gmm8Uj.


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