O Superior Tribunal de Justiça (STJ) absolveu um homem após analisar um Habeas Corpus (HC) da Coordenação de Defesa Criminal da Defensoria Pública do Rio de Janeiro (DPRJ), em um novo caso de reconhecimento fotográfico ilegal. Ele havia sido preso após ser reconhecido por uma vítima de roubo de carro, contudo, a privação da liberdade se baseou apenas na foto do acusado, que também foi o único suspeito apresentado à vítima para reconhecimento, seis meses após o crime.
 
O Habeas Corpus impugnou a decisão que condenava André (nome fictício) a 4 anos e 8 meses de prisão, inicialmente em regime semiaberto. A DPRJ tomou conhecimento do caso pela Defensoria Pública da União, que encaminhou à instituição um pedido de liberdade ajuizado pela própria família do acusado.
 
O caso teve início no final de 2016, quando uma mulher foi rendida e teve seu carro roubado na cidade de Saquarema. Na Polícia, durante depoimento, a vítima do crime disse que se lembrava do ladrão e apresentou suas características. Foi apresentada a ela uma fotografia de André, com a justificativa de que ele estaria aplicando diversos roubos na região. Ele então acabou sendo reconhecido pela vítima.
 
Em janeiro de 2017, foi expedido mandado de prisão em nome de André, preso quatro dias depois. Apenas em abril, seis meses depois do crime, foi realizada a Audiência de Instrução e Julgamento (AIJ), onde a vítima pôde ver o acusado presencialmente pela primeira vez. André foi colocado dentro de uma sala, sozinho, onde foi novamente reconhecido pela vítima, mesmo que, após novo depoimento, a vítima tenha afirmado que não tinha certeza do rosto do criminoso, já que o crime aconteceu de forma rápida e que não teve visão clara.
 
Segundo o artigo 226 do Código de Processo Penal, o reconhecimento de pessoas deve ser feito no formato "line up", ou seja, com a colocação ou apresentação de fotos de pessoas semelhantes, lado a lado, para que seja possível a comparação. Neste caso, o reconhecimento foi feito através do método "show up", no qual apenas uma pessoa é apresentada à vítima, sem comparação com outros suspeitos, atitude considerada ilegal pelo atual entendimento do Superior Tribunal de Justiça. 
 
Em seu interrogatório, André negou veementemente a prática do crime, afirmando que, no dia dos fatos, estava trabalhando em Irajá, de carteira assinada, em uma firma de construção, e que não tem carteira de habilitação nem sabe dirigir carro.

Na decisão que concedeu a ordem de Habeas Corpus para absolver André, o ministro Jesuíno Rissato, desembargador convocado do TJDFT, afirmou que o acervo probatório se mostrou frágil, pois se baseou somente nos procedimentos de reconhecimento realizados em violação à norma do artigo 226 do Código de Processo Penal, não tendo havido perícia do carro para localização de impressões digitais ou coleta de imagens de câmeras locais.

Para a Defensoria, o caso deixa explícito a injustiça que o reconhecimento fotográfico pode causar se realizado fora dos procedimentos legais, a fim de evitar incoerências e equívocos. 

– Este é apenas mais um caso, dentre diversos outros, em que o procedimento de reconhecimento foi realizado de maneira ilegal, gerando graves prejuízos ao acusado. O reconhecimento fotográfico não possui qualquer previsão legal, de forma que sequer deveria ser realizado. Contudo, ao menos o procedimento mínimo estabelecido no artigo 226 do CPP para o reconhecimento de pessoas deveria ser observado – destacou a  subcoordenadora de defesa criminal da DPRJ, Isabel Schprejer.

De acordo com a defensora, não houve apenas o desrespeito à lei no reconhecimento fotográfico em delegacia, mas também em juízo, no reconhecimento presencial, em que ele foi apresentado sozinho à vítima.

– Trata-se de mais uma injustiça corrigida pelo Superior Tribunal de Justiça, mas esperamos que a magistratura cada vez mais se conscientize acerca dos equívocos que podem ocorrer no reconhecimento de pessoas, sobretudo quando é desrespeitado o procedimento legal – ressaltou.

Texto: Igor Santana



VOLTAR