Caso ocorreu em Rio Bonito e é resultado da ação conjunta entre a Defensoria da comarca e as Coordenações da Mulher, Cível e de Família

Uma mulher, vítima de violência doméstica patrimonial, moradora de Rio Bonito, deverá receber R$ 20 mil mensais, como forma de reparação pelo uso indevido de instrumentos de trabalho de sua propriedade. O valor é resultado de uma liminar obtida pela Defensoria Pública do Rio de Janeiro em ação movida contra o ex-marido da assistida. 

Em 2015, Fabiana* abriu uma marcenaria no terreno onde ela e Wesley* (*nomes fictícios) viviam. O negócio começou a dar lucros e seu ex-cônjuge decidiu abrir uma empresa própria, usando o maquinário em conjunto com Fabiana. Dois anos depois, após uma discussão, a mulher foi agredida por seu ex-marido. Em razão dos ferimentos da agressão e sofrendo ameaças por parte de Wesley, a empresária foi obrigada a se afastar do trabalho. 

Sem fonte de renda, Fabiana não conseguiu pagar a dívida que tinha feito para aquisição do maquinário. Wesley, no entanto, continuou exercendo as atividades da empresa iniciada por ela, fazendo uso dos equipamentos, mesmo sem ter investido nos mesmos. 

Apesar do ex-cônjuge ter dado continuidade à empresa, ele não honrou os contratos fechados por Fabiana que, hoje, além da dívida, também responde por processos referentes a serviços que não foram realizados. Ao longo dos últimos cinco anos, Fabiana passou a ser beneficiária do Programa Bolsa Família e acumulou uma dívida hoje estimada em mais de R$ 200 mil.

– Foi muito difícil para mim. Éramos só eu e minha filha, então eu não tinha a quem recorrer. Fiquei uma semana internada, dois meses acamada sem poder trabalhar. Além das dívidas das máquinas, os clientes ainda me colocaram na justiça, enquanto ele [ex-marido] continuava lucrando com a empresa.

Quando procurou a DPRJ, Fabiana denunciou ameaças de seu ex-marido e pediu assistência jurídica para sua defesa em uma ação que ele havia movido contra ela, pedindo reconhecimento e dissolução de união estável e partilha de bens. Após avaliação do caso, a defensora Bruna Dutra, que atua na comarca de Rio Bonito, concluiu que não se tratava apenas de uma questão patrimonial, mas que o caso de Fabiana representava uma hipótese de violência doméstica patrimonial e psicológica que se arrastava há anos. 

– De acordo com o art. 7º, inciso IV, da Lei Maria da Penha, a violência patrimonial é forma de violência doméstica e familiar contra a mulher, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades – explica Bruna Dutra, uma das defensoras atuantes no caso.

Em outubro de 2023, a Justiça concedeu a liminar a favor de Fabiana. A defensora atribui o sucesso da ação, também, à atuação estratégica interdisciplinar da Defensoria do órgão de atuação em Rio Bonito com as Coordenações da Mulher, Cível e de Família, que contribuíram para a adoção da melhor estratégia para o caso. 

– A grande questão deste caso foi essa percepção de que não era uma mera hipótese de violência patrimonial, mas, sim, uma hipótese de violência doméstica. Além disso, foi crucial a decisão, tomada a partir dessa interlocução com os coordenadores Flávia Nascimento, José Augusto Garcia, Mauricio de Andrade e Nathália Barroso, de ser ajuizada a ação não apenas contra o ex, mas também contra a empresa da qual ele é sócio oculto juntamente com a sócia de direito, que é sua atual companheira – explica Dutra.

A coordenadora de Defesa dos Direitos da Mulher, Flávia Nascimento, diz que esse caso mostra a importância da Defensoria considerar o contexto de violência doméstica e familiar, em todos os processos em que uma das partes é uma mulher em situação de violência doméstica. 

– A assistida, além da ação referente à violência física, tinha outros processos onde a questão da violência doméstica e familiar não era considerada, embora todos fossem em decorrência da violência sofrida. Esse caso é um exemplo de atuação na área cível, com perspectiva de gênero – destaca a coordenadora.

Texto: Carolina Calháu



VOLTAR