A Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro (DPRJ) participou nesta quarta-feira (6), na condição de amicus curiae, do julgamento do Tema 1230 na Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Em sua sustentação, a Instituição defendeu a impenhorabilidade dos salários fora das exceções já previstas em lei, ressaltando os riscos sociais de uma flexibilização da norma.

O Tema 1230 trata de uma controvérsia jurídica com impacto direto na vida de milhões de brasileiros: a possibilidade de penhora de parte do salário para o pagamento de dívidas que não sejam de pensão alimentícia. A discussão gira em torno do § 2º do artigo 833 do Código de Processo Civil (CPC), que admite exceções à regra da impenhorabilidade de salários, pensões e aposentadorias.

Duas interpretações estão em jogo no julgamento. A primeira, mais permissiva, autoriza o uso de parte do salário,  mesmo quando inferior a 50 salários mínimos, para quitar dívidas civis como empréstimos, financiamentos e cartões de crédito, desde que não comprometa a subsistência do devedor. Já a segunda defende que, se a renda mensal da pessoa for inferior a esse patamar, ela deve ser totalmente protegida, independentemente da natureza da dívida, garantindo o chamado “mínimo existencial”.

A DPRJ se posicionou a favor dessa segunda interpretação, apontando que a preservação do salário de quem ganha menos de 50 salários mínimos é fundamental para assegurar uma vida digna, com acesso à alimentação, moradia, saúde e educação. Para a Instituição, flexibilizar essa garantia seria uma afronta aos direitos fundamentais das pessoas em situação de vulnerabilidade.

— O julgamento tem enorme impacto social. Revogar essa proteção significaria, na prática, uma inversão na lógica de justiça social, promovendo uma espécie de redistribuição de renda às avessas: tirando dos mais pobres, das famílias e dos trabalhadores, para beneficiar grandes instituições financeiras e credores privados — afirmou o Defensor Público José Aurélio, que representou a Instituição no julgamento.

De acordo com dados do IBGE, a renda média domiciliar per capita no Brasil é de R$ 1.848, a maior desde 2012. Ainda assim, 19% das famílias dependem de programas como o Bolsa Família para sobreviver, índice que chega a 31,7% na região Norte e 35,5% no Nordeste. Esses números reforçam, segundo a DPRJ, a urgência de proteger os rendimentos das famílias mais pobres da penhora indiscriminada.

Para José Aurélio, é falso o argumento de que a regra em debate no STJ atinge apenas uma minoria de alta renda.

— Na prática, a interpretação ampliada do § 2º do artigo 833 do CPC não visa os grandes salários, mas sim os trabalhadores de baixa renda, justamente aqueles que vivem do crédito e recebem valores modestos protegidos pela impenhorabilidade. A decisão do STJ sobre o Tema 1230 terá efeito direto em processos de execução de dívidas em todo o país, podendo impactar milhões de brasileiros que enfrentam dificuldades financeiras — alertou o Defensor.

Texto: Rafaela Jordão 



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