DPRJ garante inclusão de quilombolas no programa de merenda escolar

A merenda servida nas escolas de Campos dos Goytacazes vai carregar, a partir de agora, o sabor e a história das comunidades quilombolas. Após uma série de articulações conduzidas pela Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro, o município publicou, pela primeira vez, um edital do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) que contempla as flexibilizações necessárias para viabilizar a participação de produtores quilombolas no fornecimento de alimentos.
Por lei, 30% dos recursos federais repassados aos municípios para a merenda devem ser aplicados na compra de produtos da agricultura familiar, com prioridade para agricultores quilombolas, comunidades indígenas e assentamentos de reforma agrária. Mas, na prática, as comunidades quilombolas encontravam um obstáculo quase intransponível: a burocracia. Documentos que comprovam a posse da terra, certificados e registros fiscais se tornaram barreiras para famílias que, embora amparadas pela Constituição no direito coletivo à terra, ainda enfrentam um processo demorado de regularização pelo Incra.
Sensível a essa realidade, a Defensoria mobilizou uma rede de soluções. Reuniões foram realizadas com a Secretaria de Educação, responsável pelos editais, e com a Secretaria de Agricultura, encarregada de apoiar os produtores. Da interlocução nasceu um acordo: a Secretaria de Agricultura auxiliaria na emissão de documentos fundamentais, como o Certificado de Cadastro da Agricultura Familiar (CAF) e a inscrição estadual para a emissão de notas fiscais.
Para além da burocracia, a Defensoria esteve presente no território. Mutirões foram organizados nos quilombos de Aleluia, Batatá, Cambucá e Lagoa Feia, facilitando o acesso às certidões e formalidades necessárias para que os agricultores pudessem vender ao município.
Outro avanço veio com a aplicação da nota técnica conjunta do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) e do Ministério Público Federal (MPF), que reconhece particularidades da produção quilombola. Entre elas, a dispensa da inspeção sanitária para produtos de origem animal quando a venda ocorre dentro da comunidade e a não obrigatoriedade do CAF em certos casos. Até então, os editais municipais ignoravam essas especificidades.
O novo edital de Campos rompeu essa barreira. Ao reconhecer oficialmente as flexibilizações, abriu caminho para que alimentos produzidos nas próprias comunidades, como aipim e ovos caipiras, chegassem às mesas das escolas quilombolas. Mais do que nutrição, trata-se da preservação de uma tradição alimentar que mantém vivos alimentos como o maxixe e o quiabo – símbolos de uma herança cultural e identitária.
A Defensora Pública Carolina Henning, que atua no 1° Núcleo Regional de Tutela Coletiva, descreve os novos avanços promovidos no edital enquanto vantajosos:
– O acesso ao PNAE representa uma fonte de renda para os produtores rurais quilombolas, que podem vender seus produtos a preços mais vantajosos do que os praticados por intermediários ou grandes redes de varejo. Ao mesmo tempo, garante às crianças o direito a uma alimentação saudável e culturalmente relevante, considerando as particularidades das escolas quilombolas – Afirma a Defensora Pública Carolina Henning.
Texto: Leonardo Fernandes
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