Decisão reconhece injúria transfóbica contra mulher trans e evidencia impacto da assistência qualificada prestada pela Defensoria


A Justiça do Rio de Janeiro condenou, a dois anos de reclusão, um produtor de eventos, pelo crime de injúria transfóbica contra a freelancer Karen Muniz Nunes de Araújo, mulher trans, durante evento realizado no Museu do Amanhã, em junho do ano passado. A Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro (DPRJ) atuou como assistente qualificada da vítima, acompanhando o caso de perto e contribuindo para a garantia de seus direitos e da responsabilização do agressor.


Karen foi contratada para trabalhar no cadastramento de convidados de um evento corporativo, mas acabou exposta a um episódio de humilhação pública ao ser tratada pelo agressor com pronomes masculinos, mesmo após corrigir expressamente sua identidade de gênero. A dispensa da vítima ocorreu de forma isolada, ainda que outras pessoas da equipe também tivessem discordado de orientações sobre o uso do uniforme. Para a Justiça, o uso reiterado dos pronomes masculinos “não decorreu de equívoco”, mas representou “ato inequívoco de desdém” e recusa em reconhecer a identidade feminina da ofendida.


A decisão fixou indenização por danos morais no valor de R$10 mil à vítima. Para além do resultado jurídico, o caso expôs a fragilidade emocional, social e econômica da assistida após o episódio. O Defensor Público e Titular da 16ª Vara Criminal da Capital, Rodrigo Pacheco, responsável pela atuação da DPRJ no processo, lembra que o acolhimento começou antes mesmo da audiência.


— A vítima estava muito abalada. Ela é uma mulher extremamente vulnerável também do ponto de vista econômico e tinha muito medo de não conseguir mais oportunidades de trabalho por causa do registro da ocorrência. Havia ali uma vítima extremamente vulnerável não só pela violência contra sua identidade de gênero, mas também pelo impacto que isso teria no seu futuro — contou o Defensor.

Karen buscou apoio da Defensoria às vésperas da sessão, preocupada com a possibilidade de ser revitimizada por questionamentos ofensivos durante o interrogatório conduzido pela defesa do réu. A presença do órgão foi fundamental para garantir um ambiente seguro e respeitoso no julgamento.

Segundo Pacheco, a Defensoria atuou de forma ativa em todas as etapas — da escuta inicial às alegações finais.

— Participamos formulando perguntas na audiência, protegendo a vítima de revitimização e apresentamos alegações finais como assistência qualificada, pedindo a condenação e a reparação. No final, ela teve reconhecida a indenização, além da condenação criminal do autor da transfobia — afirmou.

A atuação evidencia uma dimensão ainda pouco conhecida e valorizada do órgão: o apoio direto a vítimas de crimes motivados por preconceito ou discriminação. Para Pacheco, essa frente é essencial e estruturante da missão da Defensoria Pública.

— É um papel fundamental da Defensoria garantir acesso à Justiça a populações vulneráveis e marginalizadas, como a população trans. Atuamos para que a vítima seja ouvida e protegida no processo criminal, para que a memória e a verdade sejam preservadas e para que haja reparação — finalizou o Defensor.

A mensagem deixada pela decisão e pela atuação Institucional é clara: transfobia não passará impune, e pessoas trans têm direito ao respeito, à memória e à reparação.

Texto: Mylena Novaes



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